MATEMÁTICA: UM EXERCÍCIO DE REFLEXÃO SOBRE O PERCURSO FORMATIVO NO ENSINO FUNDAMENTAL

Maria de Lourdes Teixeira de Oliveira[1]

Resumo

O presente artigo busca relatar ações desenvolvidas pela coordenação pedagógica na orientação e no acompanhamento do trabalho docente, no que diz respeito ao desenvolvimento do currículo de matemática aplicado a todas as turmas dos anos iniciais do ensino fundamental, ao longo dos anos de 2018 e 2019, em uma Escola Municipal de Ensino Fundamental da cidade de São Paulo, na região de São Miguel Paulista. A abordagem procura analisar reflexivamente a importância de tempos e espaços organizados para a formação continuada e os impactos sobre a aprendizagem dos estudantes, subsidiada pela implementação de ações e estratégias metodológicas no desenvolvimento dos conteúdos matemáticos, alinhados a mudanças conceituais e de paradigmas dos docentes envolvidos com a ação formativa.

Palavras-chave: Formação. Reflexão. Currículo. Avaliação. Resultados.

Introdução

Este artigo procura analisar a organização de tempos e espaços destinados à formação continuada na área de matemática para docentes atuantes em todas as turmas abrangidas pelos ciclos de alfabetização e interdisciplinar e inscritos na Jornada Especial Integral de Formação (Jeif). Procura também suscitar reflexões sobre as contribuições da referida formação nas atuações docentes em sala de aula, objetivando mais e melhores aprendizados matemáticos para os estudantes.

Uma formação continuada, de caráter dialógico, incidiu, primeiramente, na identificação das inseguranças oriundas das experiências matemáticas individuais dos professores como alunos e, posteriormente, como docentes do ensino fundamental sem formação específica em matemática. As inseguranças foram compartilhadas em um exercício sistemático de escuta, nos espaços de fala assegurados no desenvolvimento dos encontros formativos. Uma formação reflexiva oportunizou um olhar mais apurado e preparado para extrair sentidos nos fazeres matemáticos.

Este artigo propõe-se a partilhar a importância dos encontros formativos desenvolvidos nos Projetos Especiais de Ação (PEAs), seus desmembramentos e seu alcance nos papéis profissionais de docentes e do coordenador pedagógico, bem como propostas e encaminhamentos derivados dos estudos e das reflexões que embasaram as decisões pedagógicas no trato com a matemática.

Metodologia: uma pedra atirada ao lago

A busca por conhecer em que bases estavam estabelecidos os aprendizados matemáticos na escola, dentro dos ciclos de alfabetização e interdisciplinar (até o limite do segundo ano deste), originou uma investigação (não acadêmica e limitada ao lócus de trabalho) capaz de responder à distribuição dos estudantes nos diferentes níveis aferidos pelas avaliações externas – desde o preocupante “abaixo do básico” até o desejável nível “avançado” – e possibilitar a compreensão dos saberes envolvidos em cada classificação, de forma a subsidiar coerentemente as decisões formativas.

O levantamento de dados exibidos pela Provinha e Prova São Paulo deu celeridade aos processos, catalisando informações imprescindíveis à etapa qualitativa pretendida, e evidenciou a existência de desempenhos aquém dos objetivos planejados. Descoberta irrefutável: havia um problema com a matemática, e o fato não se resumia a esse jogo de palavras.

Na etapa quantitativa, também foram contabilizados os dados das avaliações internas a que haviam sido submetidos os estudantes e, embora houvesse uma melhor situação quando analisados dados do microcosmo escolar, ainda era possível reconhecer alguns “desapontamentos”.

Assim, numericamente conhecidos os desempenhos, iniciou-se a caminhada rumo à identidade dos estudantes com aprendizados mais frágeis e a investigação das causas primárias cujos resultados insatisfatórios derivavam. Era preciso que as incógnitas fossem determinadas.

Os encontros de formação, constituídos de tempos e espaços vocacionados à escuta atenta, à reverberação e à representatividade das falas de docentes e de estudantes, desencadearam: reflexões sobre a matemática praticada; trocas de experiências; estudos de caso; adequação na elaboração das propostas avaliativas e na compreensão dos resultados obtidos; tematização das práticas docentes subsidiada por estudos teóricos reveladores das concepções conscientes ou inconscientes aplicadas ao cotidiano didático da matemática e mudanças conceituais na gestão do conhecimento matemático.

Conhecer a realidade dos resultados, suas causas e seus significados foi como jogar uma pedra em um lago em repouso. A água não sabe da pedra até que reaja à sua chegada. A pedra não sabe o que causa, mas a mão que arremessa anseia que algo aconteça.

Hipótese: matemática com valor

De forma análoga à investigação sobre hipóteses de escrita dos alunos, a maior parte dos membros da equipe de formação poderia ser classificada como “silábica com valor sonoro”[2]. A realização dos encontros formativos subsidia a afirmação anterior, pois resulta das trocas de experiências sobre conceitos e conteúdos da área da matemática, das escutas das falas docentes sobre a própria formação acadêmica como professores de educação infantil e ensino fundamental I e das experiências nos percursos educacionais como estudantes e como professores nas turmas dos ciclos de alfabetização e interdisciplinar.

As reflexões teóricas realizadas durante a formação continuada indicavam que, na prática desenvolvida pelos docentes, similarmente à escrita infantil que ainda não se firmou alfabética, havia sentidos, conceitos e saberes a serem compreendidos. Um exemplo dessa compreensão incidiu sobre o conhecimento necessário às reflexões acerca do “erro matemático” como indicativo importante para a compreensão daquilo que os alunos apresentavam como saberes. Olhar para as respostas dos estudantes à procura desses saberes, e não mais dos não saberes, e considerar diferentes estágios em seus avanços matemáticos oportunizava descobertas pedagógicas e possibilitava intervenções positivas nos aprendizados.

Os estudos teóricos, aliados aos estudos de caso e à análise das produções dos estudantes, das sondagens matemáticas e da própria prática docente, contribuíram para a compreensão de como a criança aprende e desenvolve conceitos matemáticos e de como as intervenções potencializam seus avanços. Rumavam todos, estudantes e professores, em direção a novas “hipóteses de escrita”.

Um ambiente para a alfabetização matemática

Paralelamente ao que era feito em relação à ambientação das salas de aula, para que estas oferecessem estímulos traduzidos oportunamente em aprendizados para a escrita da língua, a ambientação matemática passou a fazer parte do universo escolar. Quadros de números, reta numérica, símbolos matemáticos, materiais de contagem, calendários, quadros de aniversariantes, materiais manipuláveis (ábacos, material dourado, sólidos geométricos, blocos lógicos), quadro valor de lugar (QVL), dentre outros, ganharam espaço e visibilidade nas salas de aula (Figura 1).

Figura 1 - Lousa de repertoriação matemática[3]

Fonte: acervo da autora (2019)

Outro passo direcionado à melhoria da qualidade das oportunidades de aprendizagem concentrou-se no estabelecimento de uma rotina indicativa da periodicidade de apresentação de cada eixo matemático (Figura 2).

A rotina estabelecida pelo professor em conjunto com a turma, com o uso de imagens alusivas a cada eixo (números, álgebra, probabilidade e estatística, grandezas e medidas, jogos e brincadeiras), foi afixada na parede, para que todos pudessem antecipar o que aconteceria e até mesmo “cobrar” o compromisso firmado. Assim, de forma bastante lúdica, foi possível aos estudantes participar mais ativamente do cotidiano escolar.

A elaboração e a divulgação da rotina davam ao professor melhores condições para o planejamento das ações e mais subsídios para o acompanhamento do cotidiano matemático.

 

Figura 2 - Rotina matemática[4]

Fonte: imagem extraída da internet (2019)

A destinação de uma sala para jogos/desafios matemáticos (Figura 3), frequentada semanalmente por todos os alunos, de acordo com a rotina estabelecida pela turma, contribuiu para a aproximação dos estudantes com os conteúdos matemáticos, de forma lúdica e prazerosa.

Figura 3 - Sala de jogos[5]

Fonte: acervo da autora (2019)

À coordenação pedagógica coube organizar o cronograma de uso da sala e acompanhar/orientar as propostas dos jogos selecionados pelos professores para que os aprendizados pretendidos fossem contemplados. As aprendizagens matemáticas, planejadas e desenvolvidas na perspectiva do brincar como estratégia, favoreceram aspectos interdisciplinares originalmente não intencionados.

Observou-se que a sala de jogos cumpriu o objetivo de promover mais e melhores aprendizados e possibilitou: vivências dinâmicas, divertidas e repletas de sentidos e significados (planejamento, elaboração de hipóteses, testagem, validação etc.); aproximação entre os próprios alunos e destes com os professores, melhorando também as relações no convívio escolar, e intercâmbio de saberes entre os estudantes para além da figura do professor.

Atividades de recitação e contagem que caíram em desuso, como que aguardando pela moda da próxima estação, foram reintroduzidas na rotina escolar. Era comum, ao passar pelos corredores, ouvir o som das vozes infantis “tagarelando” matemática.

Destaca-se como fator auxiliar e facilitador do desenvolvimento da rotina matemática a adoção de um livro didático (RODRIGUES; PIRES, 2017) consonante com as premissas almejadas: a apresentação de propostas pautadas na investigação e na resolução de problemas como estratégia; o trabalho com todos os eixos matemáticos desde o 1º ano e a possibilidade de interlocução dos alunos em uma concepção de produção de conhecimento e de respeito às estratégias e aos percursos diferenciados de resolução.

Observou-se que a aproximação das práticas escolares com o cotidiano fora da escola favoreceu e motivou os estudantes a participarem de vivências repletas de conteúdos matemáticos. Foi o caso da proposta do mercadinho (Figura 4).

Figura 4 - Vivência do mercadinho[6]

Fonte: acervo da autora (2019)

Ampliar as oportunidades de aplicação dos conhecimentos matemáticos em ações cotidianas, através da simulação de vivências, possibilitou o uso de uma segunda língua em um ambiente imersivo (o mercadinho), objetivando dar fluência ao léxico de uma linguagem matemática que habilita para o usufruto da cidadania no combate à realidade exemplificada por Marcelo Viana, diretor do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), em entrevista concedida a Marcel Hartmann, do jornal GZH:

O senhor já afirmou que o ensino ruim da matemática impede o exercício da cidadania no Brasil. Qual a relação?

Um amigo me enviou um vídeo no qual aparece uma moça do Nordeste que vende castanhas-de-caju no mercado. Ela diz que cada sacola é três reais, mas que duas sacolas ficam por cinco. Aí chega uma pessoa e pergunta: “Posso levar três sacolas por 10 reais?”. Só que a moça não sabe matemática, então ela responde que três sacolas por 10 reais ela não pode fazer. Ela diz isso porque não sabe matemática o suficiente para vender castanhas-de-caju, que é a profissão dela. Quando a falta de conhecimento em matemática limita o que você quer fazer como cidadão, é como se você não soubesse falar direito sua língua (HARTMANN , 2016, s/p).

A vivência de situações de compra, venda, pagamento, parcelamento, troco, entre outras, preencheu de significados as relações mediadas pela matemática. Entendimentos sobre o conteúdo do eixo “grandezas e medidas” e de aprendizados que mantêm intersecção com as demais áreas de conhecimento também foram viabilizados pelas vivências no mercadinho, com diferentes objetivos educacionais.

Por uma gestão democrática da aula de matemática

Democracia, além de ser um valor humano, é uma prerrogativa legal da gestão pública. Partindo dessa premissa, o professor, como “gestor público” do conhecimento e das pessoas (estudantes), está comprometido com o estabelecimento de relações democráticas dentro de sua área de governabilidade, afinal as mudanças na configuração dos ambientes não garantem, por si mesmas, mudanças nas atuações e nas concepções das quais os indivíduos estejam imbuídos. É preciso considerar que as mudanças ocorrem respeitando os ritmos próprios e entender que dependem do quão seguros estejam os sujeitos para tentarem novas formas de atuação. Nesse cenário, segurança requer apoio teórico para as “inovações” e um grau de insatisfação com os resultados que têm sido obtidos, os quais justificam a tentativa de novos rumos.

Uma relação democrática nas aulas vem sendo construída por parte dos docentes, e os avanços dizem respeito à elaboração compartilhada da rotina matemática e à ampliação de espaços de fala para os alunos em seus processos e percursos de aprendizagem, que, ao serem explicitados aos demais estudantes, (pro)movem os aprendizados em diferentes direções, e não exclusivamente partindo do professor para os alunos.

O currículo com o qual se deve estar alinhado objetiva uma melhor qualidade da aula, das propostas desenvolvidas e dos aprendizados. Uma gestão democrática da aula de matemática precisa oportunizar uma participação ativa e reflexiva dos estudantes em aspectos que envolvem o quê, por quê, como e quando se aprende.

Os estudos/discussões promovidos nos diferentes tempos da Jeif, das horas atividade e das reuniões pedagógicas objetivam que os docentes: reflitam sobre seu trabalho e sobre o dos pares; apropriem-se de como os alunos aprendem, buscando atuar com equidade e de forma inclusiva no reconhecimento das diferenças individuais, e assegurem a aprendizagem aos estudantes, por compreendê-los como sujeitos de direitos, entre os quais uma educação de qualidade está prevista.

O “noves fora” das avaliações internas

É preciso contextualizar que, anteriormente aos PEAs direcionados à matemática, houve, na Emef em questão, projetos voltados para a área da avaliação que promoveram reflexões sobre a prática e o uso de instrumentos avaliativos, na perspectiva trazida por Luckesi (2002, p. 81), em que a avaliação:

[...] deverá ser assumida como um instrumento de compreensão do estágio de aprendizagem em que se encontra o aluno, tendo em vista tomar decisões suficientes e satisfatórias para que possa avançar no seu processo de aprendizagem. Se é importante aprender aquilo que se ensina na escola, a função da avaliação será possibilitar ao educador condições de compreensão do estágio em que o aluno se encontra, tendo em vista poder trabalhar com ele para que saia do estágio defasado em que se encontra e possa avançar em termos dos conhecimentos [...].

Mantendo o foco nas questões matemáticas, é preciso resgatar o movimento colaborativo em que os docentes de 1º a 5º ano elaboravam, junto a seus pares, as avaliações da área, apresentando também os objetivos aos quais as atividades se propunham. Tais instrumentos eram objeto de análise, reflexão, discussão e ajustes pelos participantes em Jeif, retroalimentando e subsidiando a produção dos materiais avaliativos.

À luz da Teoria de Resposta ao Item (TRI), foi incorporada à prática avaliativa uma preocupação com os distratores[7] apresentados aos alunos, pois eles nos auxiliam na busca pelo entendimento de como o aluno organizou os pensamentos para encontrar aquilo que entende ser a resposta da questão.

A experiência enriqueceu todo o processo avaliativo, construindo relações entre o que havia sido planejado, aplicado, avaliado, efetivamente aprendido e o que carecia ser recuperado. Ao serem submetidos aos diferentes olhares dos diferentes indivíduos, os instrumentos de avaliação ganharam qualidade, fornecendo informações mais fidedignas sobre as necessidades dos alunos e servindo como meio de replanejamento das ações docentes.

A geometria das ações: PEAs de matemática

A segurança necessária para as mudanças didáticas pretendidas está relacionada a aspectos importantes da formação continuada, no fornecimento de subsídios teóricos que impulsionem e direcionem as ações, sendo capazes de apontar uma destinação assertiva e uma aterrissagem tranquila no local almejado.

Os PEAs intitulados “Matemática: um currículo para a vida” – 2018, “Currículo em atividade” – 2019 e “Gestão das aprendizagens” – 2020 basearam-se na análise dos dados (internos e externos) das aprendizagens dos estudantes, nas proposições curriculares, nos planejamentos docentes, nas avaliações elaboradas e no acompanhamento da rotina escolar e dos aprendizados dos sujeitos envolvidos na condição discente ou docente.

A expressão “geometria das ações” procura uma similaridade com o sentido literal da medida (metria) da terra (geo), em que a coordenação pedagógica atuou para que se conhecesse o terreno no qual houve a semeadura dos estudos teóricos e das reflexões sobre a prática.

Em um caminhar descendente direcionado às fundações em que se edificaram as diferentes construções profissionais, o PEA de 2018 oportunizou a identificação das inseguranças relativas ao aprofundamento da matemática com o recordar de experiências como alunos, das lacunas da formação inicial, das incompreensões e das incorreções conceituais que acompanhavam o exercício docente.

Estudar as práticas docentes em um ambiente reflexivo tornou possível identificar situações “normais”, mas que dificultam a construção de aprendizagens futuras, por serem questionáveis, do ponto de vista conceitual, e dissipáveis, com a realização da formação continuada. Exemplos disso são dizer a um estudante dos anos iniciais que de 5 não se pode tirar 6 ou apresentar a tabuada do 2 como sendo o resultado de 2 x 1, 2 x 2, 2 x 3.

O trabalho formativo nos anos de 2018 e 2019 esteve voltado ao estudo e a uma prática reflexiva, direcionado por referenciais teóricos, como o Programa Nacional de Alfabetização na Idade Certa (Pnaic)[8] (BRASIL, 2014), o Projeto Educação Matemática nos Anos Iniciais (Emai)[9] (SÃO PAULO, 2013), o Currículo da Cidade (SÃO PAULO, 2019a), as Orientações Didáticas para a Matemática (SÃO PAULO, 2019b; 2019c), além da companhia da obra de autores, como Vergnaud (2009) e os campos conceituais, Rodrigues e Pires (2017) e as questões curriculares e o apoio com o livro didático, D’Ambrósio (2019) e as reflexões sobre a etnomatemática e Kamii (1990) e os estudos sobre a criança e o número.

Um fator impactante na rotina da matemática e de fácil realização prática esteve centrado nas variações do termo desconhecido.

Na prática do professor é preciso destacar especial atenção para a posição do termo desconhecido e para a importância de se trabalhar com problemas variando a posição desse termo, além da exploração de todos os significados dos problemas do Campo Aditivo (SÃO PAULO, 2019b, p. 81).

Assim, houve uma ruptura na apresentação de enunciados previsíveis, passando à oferta de propostas que objetivavam melhores procedimentos de investigação e resolução por parte dos estudantes. Foram substituídas atividades que partiam de enunciados como 5 + 6 = ? por propostas que passaram a indicar percursos diversos, como ? + 5 = 11 ou 5 + ? = 11.

A aplicação dos estudos teóricos na vivência prática da aula, cumprindo o objetivo maior dos PEAs, resultou no fortalecimento das ações formativas como promotoras de aprendizagens para todos os sujeitos: para os docentes, pois essa aplicação os apoiou nos entendimentos para uma melhor atuação didática na matemática, e para os alunos, oportunizando um ambiente mais desafiador, significativo e propício ao desenvolvimento de suas potencialidades. A experiência de aprendizado gerou novas demandas formativas. A opção pelo direcionamento para a matemática no ano de 2020, interrompido em sua execução original pelas inimagináveis situações trazidas pela Covid-19 e alterado em sua configuração, mantém o propósito de fazer estudantes e docentes avançarem.

A aritmética dos resultados

O empenho docente, parcela importante para a conquista de objetivos educacionais, somado à parcela que concerne à coordenação pedagógica, qual seja, a garantia de oportunidades em que se obtenha a melhoria das condições das ações didáticas, anseiam por um mesmo resultado: o avanço das aprendizagens.

Os gráficos a seguir (Figuras 5, 6, 7 e 8) apresentam conquistas e multiplicam os desafios. Respondem a algumas indagações e suscitam novas reflexões importantes: por que algumas turmas aparecem com resultado abaixo do básico? Quais turmas foram acompanhadas por docentes em formação? Como se explicam os excelentes resultados dos 2os anos em 2019?

Figura 5 - Provinha São Paulo – Edições 2018 e 2019 – Matemática – 2º ano

Fonte: Sistema Educacional de Registro de Aprendizagem (Serap)[10]

Figura 6 - Prova São Paulo – Edições 2018 e 2019 – Matemática – 3º ano

Fonte: Serap

Figura 7 - Prova São Paulo – Edições 2018 e 2019 – Matemática – 4º ano

Fonte: Serap

Figura 8 - Prova São Paulo – Edições 2018 e 2019 – Matemática – 5º ano

Fonte: Serap

É possível verificar que, entre todas as turmas avaliadas pela Provinha e Prova São Paulo em 2019, somente a turma do 3º ano A obteve um resultado classificado como “abaixo do básico”. Cumpre apontar que a referida turma passou por substituição de docentes, com profissional não participante de horários de formação e horas atividade coletivos. Tal reflexão não surpreende e corrobora uma situação antevista, em que não foi possível exercer uma ação formativa, a ponto de melhor reverberar os aprendizados, atestando a relevância de uma formação continuada e sistemática.

Considerações finais

Os resultados obtidos, que ainda carecem de melhorias, revelaram interpretações no reconhecimento de que uma abordagem matemática com o desenvolvimento de todos os eixos do currículo contemplados em todos os bimestres caminhou em direção a melhores desempenhos.

A vivência de uma matemática mais lúdica e prazerosa não resolveu todos os problemas conceituais das crianças, e isso não era o esperado, mas foi capaz de colaborar criando um ambiente promotor de aprendizados mais significativos e desejados pelos estudantes. Estes, em uma demonstração de mais intimidade com eixos como álgebra, probabilidade e estatística, grandezas e medidas, mesmo não reconhecendo tais nomenclaturas e apoiando-se imageticamente nas rotinas em sala de aula, descobriram-se “sabedores” em seus processos de aprendizagem e “ensinadores”, ao compartilharem suas maneiras próprias na resolução das propostas.

Nos percursos matemáticos avaliados por instrumentos externos referentes à Provinha e Prova São Paulo realizadas nos anos de 2017 (ano anterior aos PEAs), 2018 e 2019, foi possível verificar um aumento do número de turmas classificadas no nível “adequado”, sendo que: em 2017, nenhuma turma avaliada foi classificada no nível mencionado; no ano de 2018, 16% das turmas avaliadas atingiram esse escore; no ano de 2019, o percentual de 27% das turmas compunha o total das classes no referido nível.

No ano de 2019, com o índice de 6.3, superou-se a meta projetada para 2021, que era de 6.1. Aquilo que, à distância, pode parecer um passo singelo, quando analisado mais proximamente ganha contornos expressivos, ao se olhar o passado e reconhecer um escore de 3.9 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), no ano de 2005.

Situações particulares impeditivas da participação da totalidade dos docentes nos PEAs dificultam as atuações didáticas diretas e oriundas do estudo teórico, da tematização das práticas e da homologia dos processos. O envolvimento do coletivo em decisões sobre planejamento, elaboração das avaliações, análise dos resultados e propostas de intervenção evidenciou a importância de sua manutenção, reforçando o foco na formação dos professores e no acompanhamento das aprendizagens.

As novas rotinas educativas trazidas pela Covid-19 interromperam as formações que vinham se desenvolvendo e acrescentaram demandas imperiosas voltadas à recuperação das aprendizagens. Assim, o caminho traçado durante e após a pandemia precisa recuperar as trajetórias sem perder as características que configuraram a mudança metodológica e didática que se havia conseguido. Será preciso absorver novos, diferentes e maiores desafios nas rotinas escolares naquilo que representa o atendimento aos alunos em diferentes modalidades de atendimento[11], no acompanhamento da (re)composição das aprendizagens e na formação docente.

A matemática que revela resultados e aponta fragilidades e carências é a mesma que fornece elementos para a compreensão do mundo ao redor e para a participação efetiva de cidadãos plenos no usufruto dos direitos.

Identificadas as fundações sobre os conhecimentos matemáticos obtidos ao longo da carreira como docentes dos anos iniciais, mudadas algumas concepções e paradigmas, lançados fora entendimentos imperfeitos e inconsistentes, chegou-se à conclusão de que ainda há muita terra a ser revolvida e escavada na descoberta do magma a ser solidificado nas ações futuras.

Aqui repousa o artigo encerrado. O trabalho formativo? Continua...

Referências

BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Apoio à Gestão Educacional. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa: Apresentação / Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, Diretoria de Apoio à Gestão Educacional. – Brasília: MEC, SEB, 2014. Disponível em: <https://www.cenpec.org.br/wp-content/uploads/2020/01/Numeramento_Apresenta%C3%A7ao.pdf>. Acesso em: 04 nov. 2021.

D’AMBRÓSIO, U. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.

 

HARTMANN, M.  “Crise não é desculpa para cortar verbas da ciência”, diz matemático brasileiro premiado. 2016.  Disponível em: <https://gauchazh.clicrbs.com.br/comportamento/noticia/2016/06/crise-nao-e-desculpa-para-cortar-verbas-da-ciencia-diz-matematico-brasileiro-premiado-6133689.html>. Acesso em: 18 jun. 2021.

 

KAMII, C. A criança e o número: implicações educacionais da teoria de Piaget. Campinas, SP: Editora Papirus, 1990.

LUCKESI, C. C. Avaliação da aprendizagem escolar. São Paulo: Cortez, 2002.

RODRIGUES, I. C.; PIRES, C. M. C. Nosso livro de matemática: ensino fundamental – anos iniciais. São Paulo: Zapt Editora, 2017.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação. Coordenadoria de Gestão da Educação Básica. Departamento de Desenvolvimento Curricular e Gestão da Educação Básica. EMAI: educação matemática nos anos iniciais do ensino fundamental; organização dos trabalhos em sala de aula; material do professor – primeiro ano. São Paulo, SE, 2013. Disponível em: <http://www.se-pmmc.com.br/emai/arquivos/professor/volume_ii/emai_1_ano_professor_vol.2.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2021.

SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Coordenadoria Pedagógica. Currículo da Cidade: Ensino Fundamental: Matemática. 2. ed. São Paulo: SME/Coped, 2019. Disponível em: <http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Portals/1/Files/50629.pdf>. Acesso em: 18 jun. 2021. (2019a)

______. Secretaria Municipal de Educação. Coordenadoria Pedagógica. Orientações didáticas do currículo da cidade: Matemática – volume 1. – 2. ed. – São Paulo: SME/Coped, 2019. Disponível em: <https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/03/OD-Matematica-v.1.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2021. (2019b)

______. Secretaria Municipal de Educação. Coordenadoria Pedagógica. Orientações didáticas do currículo da cidade: Matemática – volume 2. – 2.ed. – São Paulo: SME/Coped, 2019. Disponível em: <https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/03/OD-Matematica-v.2.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2021. (2019c)

VERGNAUD, G. A criança, a matemática e a realidade: problemas do ensino da matemática na escola elementar. Tradução de Maria Lúcia Faria Moro. Curitiba: UFPR, 2009.

 

[1] Pedagoga formada pelas Faculdades Metropolitanas Unidas. Especialista em Gestão Escolar. Foi professora, diretora e supervisora escolar da rede estadual de ensino paulista. Atua na coordenação pedagógica da rede de ensino do município de São Paulo desde 2008.

[2] Nível silábico com valor sonoro: ao escrever, a criança faz a relação da letra com seu fonema mais forte, ou seja, cada letra utilizada corresponde a um fonema que compõe a sílaba. Disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/programa_aceleracao_estudos/alfabetizacao_letramento.pdf>. Acesso em: 04 nov. 2021.

[3] Lousa de repertório, com material elaborado pela professora Milena de Jesus da Silva para os alunos do 3º ano do ciclo de alfabetização da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Senador Lino de Mattos – Diretoria Regional de Educação São Miguel.

[4] Ilustrações alusivas aos eixos matemáticos do Currículo da Cidade – Matemática: números e operações; probabilidade e estatística; álgebra; grandezas e medidas e jogos e brincadeira.

[5] Vivência de jogo de estratégia – 2º ano do ciclo interdisciplinar, com a professora Sônia Aparecida de Godoy Mazzucco, que autorizou a utilização de sua imagem. Quanto às imagens dos estudantes, foram formatadas recebendo efeito artístico que impossibilita a identificação.

[6] As imagens dos estudantes foram formatadas recebendo efeito artístico que impossibilita a identificação. Para veiculação de propostas escolares, os responsáveis pelos estudantes autorizaram o uso das imagens.

[7] Distratores são alternativas que contêm respostas com os erros frequentemente cometidos pelos estudantes ou que apresentam sentido, mas não dentro da proposta da questão. Uma análise dos distratores pode indicar o pensamento utilizado para responder à questão.

[8] “O PNAIC é um programa integrado cujo objetivo é a alfabetização em Língua Portuguesa e Matemática, até o 3º ano do Ensino Fundamental, de todas as crianças das escolas municipais e estaduais, urbanas e rurais, brasileiras”. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=11268-gt-capitais-pnaic-apresentacao-21062012-pdf&Itemid=30192>. Acesso em: 27 jun. 2021.

[9] “O EMAI compreende um conjunto de ações que têm como objetivo articular o processo de desenvolvimento curricular em Matemática, a formação de professores, a avaliação de desempenho dos estudantes e elementos chave de promoção da qualidade da educação”. Disponível em: <https://www.educacao.sp.gov.br/conheca-o-emai-material-didatico-que-introduz-matematica/>. Acesso em: 27 jun. 2021.

[10] Informações sobre o Serap em: <https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/sistemas-pedagogicos/sistema-educacional-de-registro-e-aprendizagem-serap/>. Acesso em: 12 jun. 2021.

[11] Vide Instrução Normativa SME nº 1, de 28 de janeiro de 2021, que estabelece procedimentos para a organização das Unidades Educacionais da Rede Municipal de Ensino por ocasião do início do ano letivo e retorno dos estudantes às atividades presenciais. Disponível em: <http://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/instrucao-normativa-secretaria-municipal-de-educacao-sme-1-de-28-de-janeiro-de-2021>. Acesso em: 04 nov. 2021.

 


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