LEI Nº 17.109, DE 4 DE JUNHO DE 2019
(Projeto de Lei nº 126/16, do Vereador Eduardo Tuma – PSDB)
Institui o Código Municipal de Defesa do Consumidor e dá outras providências.
BRUNO COVAS, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 14 de maio de 2019, decretou e eu promulgo a seguinte lei:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º O presente Código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor no âmbito e no interesse local do Município de São Paulo, nos termos do art. 5º, inciso XXXII, art. 170, inciso V e art. 30, incisos I e II, todos da Constituição Federal e da Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
Art. 2º A Política Municipal das Relações de Consumo tem como princípios:
I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;
II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor;
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico;
IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, com vistas à melhoria do mercado de consumo;
V - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo;
VI - racionalização e melhoria dos serviços públicos.
Seção I
Das Práticas Abusivas
Art. 3º Constituem práticas abusivas dentre outras, nas relações de consumo municipal:
I - a exigência de dois ou mais laudos da assistência técnica para a troca de produto viciado (defeituoso);
II - a exigência de caução para atendimento médico-hospitalar;
III - a exposição de informações e anúncios que contrariam as normas do presente Código Municipal de Defesa do Consumidor, bem como de outras normas de proteção consumerista;
IV - o não fornecimento de cópia contratual, por meio físico ou digital, antes da manifestação de anuência do consumidor;
V - transferir ao consumidor o ônus do custo da cobrança nos boletos bancários;
VI - o estabelecimento de limites quantitativos na venda dos produtos ofertados;
VII - na oferta de produtos e serviços, deve constar o preço individual no anúncio;
VIII - o corte de serviço essencial na véspera de final de semana e feriados;
IX - a não disponibilização de atendimento direto ao consumidor no Município;
X - retenção do original da nota fiscal do produto na assistência técnica;
XI - a demora superior a 5 (cinco) dias úteis para a retirada do nome dos consumidores inadimplentes do Serviço de Proteção ao Crédito – SPC e Serasa, após quitação de débitos;
XII - manter o nome do consumidor nos cadastros de restrição ao crédito no caso de renegociação da dívida, em prazo superior a 5 (cinco) dias úteis, contados desde a data da assinatura pelas partes;
XIII - cobrança de consumação mínima ou obrigatória nos bares, restaurantes e casas noturnas;
XIV - a não afixação em bares e restaurantes dos preços de serviços e produtos oferecidos ao consumidor;
XV - a oferta publicitária que não informa sobre o prazo para entrega de mercadorias;
XVI - oferecer balas ou outros produtos para complementar o troco;
XVII - eximir de responsabilidade o fornecedor nos casos de furto ou qualquer dano constatado nos veículos estacionados em áreas preservadas para este fim, em seu estabelecimento.
Seção II
Das Cláusulas Abusivas
Art. 4º São consideradas abusivas, dentre outras, as seguintes cláusulas contratuais:
I - elejam foro para dirimir conflitos decorrentes das relações de consumo diverso daquele onde reside o consumidor;
II - imponham, em caso de impontualidade, a interrupção de serviço essencial, sem aviso prévio, com prazo inferior a 15 (quinze) dias;
III - não restabeleçam integralmente os direitos do consumidor a partir da purgação da mora;
IV - impeçam o consumidor de se beneficiar do evento do termo de garantia contratual que lhe seja mais favorável;
V - atribuam ao fornecedor o poder de escolha entre múltiplos índices de reajuste, entre os admitidos legalmente;
VI - permitam ao fornecedor emitir títulos de crédito em branco ou livremente circuláveis por meio de endosso na apresentação de toda e qualquer obrigação assumida pelo consumidor;
VII - imponham limite ao tempo de internação hospitalar que não prescrito pelo médico;
VIII - permitam ao fornecedor de serviço essencial (água, energia elétrica, telefonia) incluir na conta sem autorização expressa do consumidor a cobrança de outro serviço, excetuando-se os casos em que a prestadora do serviço essencial informe e disponibilize gratuitamente ao consumidor a opção de bloqueio prévio na cobrança ou utilização dos serviços de valor adicionável;
IX - estabeleçam, nos contratos de prestação de serviços educacionais, a vinculação à aquisição de outros produtos ou serviços;
X - exijam a assinatura de duplicatas, letras de câmbio, notas promissórias ou quaisquer outros títulos de crédito em branco;
XI - subtraiam ao consumidor, nos contratos de seguro, o recebimento de valor inferior ao contratado na apólice;
XII - estipulem presunção de conhecimento por parte do consumidor de fatos novos não previstos em contrato;
XIII - estabeleçam restrições ao direito do consumidor de questionar nas esferas administrativa e judicial possíveis lesões decorrentes de contrato por ele assinado;
XIV - autorizem, em virtude de inadimplemento, o não fornecimento ao consumidor de informações de posse do fornecedor, tais como: histórico escolar, registros médicos, e demais do gênero;
XV – (VETADO)
XVI - prevejam, nos contratos de seguro de automóvel, o ressarcimento pelo valor de mercado, se inferior ao previsto no contrato;
XVII - autorizem o envio do nome do consumidor ou seus garantes a banco de dados e cadastros de consumidores sem notificação prévia por envio de carta simples e por meio eletrônico;
XVIII - obriguem o consumidor, nos contratos de adesão, a manifestarem-se sobre a transferência, onerosa ou não, para terceiros, dos dados cadastrais confiados ao fornecedor, sem observância da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018;
XIX - autorizem o fornecedor a investigar a vida privada do consumidor de forma contrária à legislação pátria.
CAPÍTULO II
DAS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS
Art. 5º Nos casos de infração a este Código Municipal de Defesa do Consumidor, ficará o fornecedor sujeito às seguintes espécies de sanções administrativas, sendo o procedimento do processo administrativo regido pelos arts. 33 e seguintes do Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, da Presidência da República:
I - multa;
II - apreensão do produto;
III - inutilização do produto;
IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
V - proibição de fabricação do produto;
VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviços;
VII - suspensão temporária da atividade;
VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;
IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade;
XI - intervenção administrativa;
XII - imposição de contrapropaganda.
Art. 6º A pena de multa nas infrações ao Código de Defesa do Consumidor será graduada dentro dos limites previstos na Lei Federal nº 8.078, de 1990, e Decreto Federal nº 2.181, de 1997.
Art. 7º Compete à Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon a aplicação das sanções administrativas previstas no art. 5º da presente Lei.
Seção I
Da Inscrição em Dívida Ativa
Art. 8º Não sendo recolhido o valor da multa aplicada, em 30 (trinta) dias da ciência do autuado sobre decisão administrativa definitiva, será o débito encaminhado à Procuradoria Geral do Município para inscrição em dívida ativa, acrescido de honorários e demais encargos para cobrança.
Parágrafo único. O Procon Paulistano encaminhará periodicamente à Procuradoria Geral do Município as informações necessárias ao cumprimento do previsto no “caput”.
Seção II
Da Destinação dos Recursos
Art. 9º Os valores arrecadados pela cobrança de multas aplicadas na conformidade desta Lei serão destinados ao Fundo Municipal dos Direitos do Consumidor e utilizados para financiamento de projetos relacionados com os objetivos da Política Municipal das Relações de Consumo, com a defesa dos direitos básicos do consumidor e com a modernização administrativa do Procon Paulistano.
CAPÍTULO III
DO ATENDIMENTO AO CONSUMIDOR
Art. 10. Serão atendidos pela Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal os consumidores, pessoas físicas ou jurídicas, domiciliados no Município de São Paulo, que tiverem estabelecido relação jurídica de consumo com fornecedores, pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, públicas ou privadas, nos termos do art. 3º da Lei Federal nº 8.078, de 1990.
Art. 11. As reclamações de consumo podem ser instauradas a pedido do consumidor ou de ofício, devendo conter todos os requisitos legais e formais necessários à sua tramitação.
Art. 12. A Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal, mediante análise técnica, poderá proceder de imediato ao registro de reclamação, independentemente de notificação preliminar, bem como converter os casos apresentados a título de consulta em reclamações de ofício.
Art. 13. As notificações e intimações da Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal serão realizadas:
I - por correio eletrônico, mediante prova de sua entrega no endereço eletrônico do consumidor ou fornecedor;
II - por comunicações eletrônicas encaminhadas por meio do aplicativo de troca de mensagem verificável, direcionadas ao número de telefone cadastrado na Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal;
III - pessoalmente;
IV - por correio;
V - por edital devidamente publicado, quando resultar improfícuo quaisquer dos meios previstos nos incisos I a IV do “caput” deste artigo;
VI - por outras formas previstas na legislação em vigor.
§ 1º Para a notificação ou intimação de que tratam os incisos I e II do “caput” deste artigo, considera-se como domicílio:
a) do consumidor: o endereço eletrônico e o número de telefone indicados pelo consumidor, constantes do cadastro no sítio eletrônico da Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal;
b) do fornecedor: o endereço eletrônico e o número de telefone informados pelo fornecedor à Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal, quando de sua adesão à plataforma de atendimento ao consumidor ou por outros meios.
§ 2º A utilização das formas de notificação e intimação previstas nos incisos I a IV do “caput” deste artigo não está sujeita a ordem de preferência.
Art. 14. Findo o procedimento de atendimento e encaminhamento, a Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal proferirá manifestação conclusiva determinando a sua classificação final em:
I - reclamação fundamentada atendida;
II - reclamação fundamentada não atendida;
III - reclamação encerrada;
IV - reclamação não fundamentada;
V - consulta fornecida.
Parágrafo único. Para a caracterização da reclamação fundamentada, nos termos do inciso II do art. 58 do Decreto Federal nº 2.181, de 1997, apta a integrar o cadastro de que trata o art. 44 da Lei Federal nº 8.078, de 1990, será analisada a notícia ou ameaça de lesão apresentada quanto à verossimilhança das alegações e quanto ao nexo de causalidade entre os fatos narrados e a lesão ou ameaça de lesão neles apontadas, não se exigindo, para tanto, a comprovação de sua efetiva ocorrência.
Art. 15. Pelo registro e encaminhamento de reclamações fundamentadas analisadas pela Coordenadoria de Defesa do Consumidor – Procon Municipal serão cobrados emolumentos a serem recolhidos pelos fornecedores reclamados.
§ 1º Os emolumentos serão destinados, exclusivamente, ao Fundo Municipal de Defesa do Consumidor – FMDC.
§ 2º Caberá ao fornecedor reclamado o recolhimento dos emolumentos.
§ 3º Em nenhuma hipótese caberá ao consumidor o pagamento dos emolumentos.
§ 4º As reclamações não fundamentadas, encerradas e as consultas fornecidas não serão passíveis de recolhimento de emolumentos.
Art. 16. O valor dos emolumentos corresponderá a:
I - R$ 300,00 (trezentos reais) por reclamação fundamentada atendida;
II - R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais) por reclamação fundamentada não atendida.
Parágrafo único. Os valores referidos nos incisos I e II do “caput” deste artigo serão atualizados em fevereiro de cada ano, pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, do exercício anterior, ou por outro índice que vier a substituí-lo.
Art. 17. No caso de reclamações coletivas, o cálculo deverá considerar o número de consumidores reclamantes e afetados pela prática ilícita do fornecedor.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 18. No desempenho de suas funções, os órgãos do Sistema Municipal de Defesa do Consumidor poderão manter convênios com entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos para a persecução dos fins desta Lei, com a aprovação prévia do Conselho Municipal de Defesa do Consumidor.
Art. 19. Compete ao Poder Executivo fornecer a infraestrutura necessária para o funcionamento dos órgãos públicos municipais disciplinados nesta Lei.
Art. 20. O Poder Executivo regulamentará no que couber esta Lei.
Art. 21. Este Código entra em vigor na data da sua publicação.
PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 4 de junho de 2019, 466º da fundação de São Paulo.
BRUNO COVAS, PREFEITO
JOÃO JORGE DE SOUZA, Secretário Municipal da Casa Civil
RUBENS NAMAN RIZEK JUNIOR, Secretário Municipal de Justiça
Publicada na Casa Civil, em 4 de junho de 2019.
Publicado no DOC de 05/06/2019 – p. 01
RAZÕES DE VETO
PROJETO DE LEI Nº 126/2016
OFÍCIO A. T. L. Nº 30, DE 4 DE JUNHO DE 2019
REF.: OFÍCIO SGP-23 Nº 00852/2019
Senhor Presidente
Por meio do ofício referenciado, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia do Projeto de Lei nº 126/2016, de autoria do Vereador Eduardo Tuma, aprovado na sessão de 14 de maio do corrente ano, que institui o Código Municipal de Defesa do Consumidor.
Acolhendo a propositura, ante a inegável importância da matéria, vejo-me compelido, no entanto, a apor veto ao inciso XV do artigo 4º, segundo o qual é abusiva a cláusula contratual que autorize o envio do nome do consumidor e/ou seus garantes a cadastros de consumidores, enquanto houver discussão em juízo afeta à relação de consumo.
Não obstante o meritório intento colimado, a regra em questão avança sobre a competência privativa da União para legislar sobre direito processual, estatuída no artigo 22, inciso I, da Constituição Federal, ao dispor sobre os efeitos decorrentes da pendência de ação judicial.
É bem verdade que o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor pressupõe atuação integrada e coordenada dos entes federativos na proteção e defesa dos direitos inerentes às relações de consumo, nos termos do artigo 105 da Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor). Contudo, o reconhecimento da competência administrativa e fiscalizatória em matéria consumerista não implica o automático reconhecimento da competência legislativa irrestrita nesta matéria. Assim, ainda que observado o interesse local, ao suplementar a legislação federal ou estadual, não é dado aos Municípios dispor sobre matéria processual civil, mesmo no caso de ações judiciais afetas às relações de consumo.
Enquanto o Código de Defesa do Consumidor admite e regulamenta a inscrição de devedores em bancos de dados e cadastros de consumidores, o Código de Processo Civil não desonera o devedor do pagamento de suas obrigações, em razão da mera propositura de demanda judicial. Ao contrário, obriga-o a indicar as parcelas controversas e a continuar a honrar com o valor incontroverso da sua obrigação no tempo e modo contratados (art. 330, §§ 2º e 3º).
No mesmo sentido, interpretando a legislação federal sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça fez publicar a Súmula nº 380 do STJ, segundo a qual a simples propositura de ação de revisão de contrato não inibe a caracterização de mora do autor. Por esta razão, a abstenção de inscrição do consumidor inadimplente em bancos de dados e cadastros apenas pode ser exigida caso exista medida liminar ou cautelar específica, não decorrendo do mero protocolo de ação judicial.
Em assim sendo, embora reconhecendo o evidente mérito da iniciativa, sou compelido a apor-lhe veto parcial, atingindo o inciso XV do seu artigo 4º, com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Maior Local, devolvendo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa Legislativa.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.
BRUNO COVAS, Prefeito
Ao Excelentíssimo Senhor
EDUARDO TUMA
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Publicado no DOC de 05/06/2019 – p. 03