A preocupação em desenvolver na escola competências socioemocionais, como resiliência, liderança ou cooperação, vai ganhar força no texto final da Base Nacional Comum Curricular.

Fonte: Folha de São Paulo

Alunos

O documento, discutido desde 2015, define o que os alunos devem aprender em cada ano e etapa, da creche ao ensino médio. A base vai orientar redes e escolas na produção de seus currículos.

As duas versões apresentadas até agora pelo MEC (Ministério da Educação) tinham uma presença tímida desses conceitos, também chamados de "competências do século 21". Isso foi apontado como uma fragilidade do texto.

Agora, a base terá uma nova diretriz de organização dos objetivos de aprendizagem, a partir de três "macrocompetências": pessoais e sociais (socioemocionais), cognitivas (os conteúdos das disciplinas) e comunicacionais.

Isso não aparecia na segunda versão da base, conhecida em maio. "É impossível desenvolver o cognitivo sem desenvolver simultaneamente o socioemocional e o comunicativo, que são essenciais para a formação integral", diz a secretária executiva do MEC, Maria Helena Guimarães de Castro.

As habilidades socioemocionais estarão "o tempo todo na base", segundo Castro, e "vão se desdobrar nos objetivos de aprendizado". Ela ainda ressalta a importância das competências comunicativas, com a apreensão de múltiplas linguagens para o mundo atual.

Essas três esferas serão ancoradas aos chamados princípios "éticos, políticos e estéticos". Já previstos, esses princípios se referem aos direitos dos alunos desenvolverem, por exemplo, o respeito e o acolhimento da diversidade, a capacidade do diálogo e a criatividade.

IMPORTÂNCIA

A atenção às competências não cognitivas ganhou força nos últimos anos após evidências de que características de atitude (como organização) podem impactar no aprendizado. Colaboram ainda para formar um adulto preparado para um mundo em rápida transformação.

Tem sido comum a constatação de que os profissionais de hoje são contratados pelo cognitivo, mas demitidos pelo socioemocional. Mesmo quem domina conhecimentos técnicos não demonstra competências pessoais -que vão do trabalho em equipe à ética e responsabilidade.

Bases curriculares de outros locais, como a de Cingapura (líder na última avaliação internacional, o Pisa), preveem essa abordagem, que não se resume ao aprendizado das disciplinas.

Para Anna Penido, diretora do Instituto Inspirare, é importante que a base "olhe pra frente" e não seja uma releitura dos parâmetros curriculares. "Tem uma série de coisas que são mais relacionadas à atitude do que ao conhecimento puro e simples", diz ela, integrante do Movimento pela Base, organização que reúne várias instituições e pesquisadores.

Ela lembra do desafio de o documento incorporar essas habilidades, sem um isolamento de "temas". "A base tem de dar materialidade para quem está na escola."

O educador Mozart Ramos, do Instituto Ayrton Senna, lembra que a abordagem socioemocional envolve intenções nas aulas, com um trabalho mais colaborativo e que busque promover o pensamento autônomo dos alunos.

"Essas habilidades ajudam a desenvolver potencialidades", diz. "Não é colocar outras coisas na escola, mas articular. Se vou trabalhar com futebol, isso tem que dialogar intencionalmente com o desenvolvimento integral", diz ele, citando características presentes no esporte, como disciplina e empatia.

PRÓXIMOS PASSOS

Como a terceira e última versão não foi apresentada, não é possível avaliar se essas conexões existem. Superada essa discussão, analistas são unânimes em reafirmar que, sem um projeto de formação de professores, o esforço pode virar letra morta.

O primeiro texto, de setembro de 2015, recebeu 12 milhões de colaborações em uma consulta pública. As duas versões ainda foram alvo de várias leituras críticas. Maria Helena, do MEC, diz que tudo tem sido aproveitado.

A base deveria estar pronta no meio de 2016. Após o impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), o MEC queria fechar o documento da educação infantil e ensino fundamental ainda neste ano, o que não ocorreu. O novo prazo agora é fevereiro de 2017, quando a base vai para o Conselho Nacional de Educação. O órgão deve fazer audiências públicas.

O MEC segurou a parte do ensino médio. O texto será fechado após a aprovação da medida provisória que reforma a etapa, em trâmite no Congresso. Esse bloco deve estar pronto até o segundo semestre de 2017, e seguirá a organização de competências.

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Calendário

26.jun.2014 - Plano Nacional de Educação é sancionado; lei prevê que o governo crie proposta de base curricular em até dois anos

16.set.2015 - MEC apresenta a 1ª versão do documento e abre consulta pública; as áreas de história e gramática geraram polêmica

15.dez.2015 - Ministério inicia análise das contribuições recebidas na consulta pública

3.mai.2016 - MEC divulga 2ª versão da base e a envia ao Conselho Nacional de Educação e a representantes de Estados e municípios

jun. a ago.2016 - Texto está sendo debatido nos Estados e deve ser devolvido ao MEC até agosto

ago a nov.2016 - Um comitê gestor vai revisar a base (ensinos infantil e fundamental) e debater o ensino médio

nov.2016 - O objetivo é ter a versão final até essa data (para infantil e fundamental), mas não há previsão de quando ela começa a valer

1ºsem.2017 - MEC deve definir a base curricular do ensino médio, após aprovação de projeto de lei no Congresso que prevê um novo formato para a etapa

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