Falta condições de trabalho e de oferta de formação continuada ao coordenador pedagógico são complicadores que devem ser considerados.

O município de São Paulo criou em 1985 o cargo de coordenador pedagógico. As funções desse profissional sofreram muitas alterações desde então, principalmente pela descontinuidade das políticas educacionais dos governos.

Na prática, o coordenador acaba sendo impelido a seguir um rol de orientações que vem da SME, previamente decidido sem debate com os profissionais envolvidos, conhecedores da realidade das escolas, e sem espaço de debate no ambiente escolar antes da aplicação .

O coordenador, assim como os demais gestores educacionais, também sofre com excesso de trabalho burocrático e está sempre envolvido com a resolução de conflitos e situações emergenciais, o que reduz muito o seu tempo de estudo e de trabalho pedagógico junto aos professores.

Para piorar, os órgãos centrais realizam pouca formação e não proporcionam condições adequadas e concretas de trabalho.

O estudo feito há 11 anos pelo SINESP, o Retrato da Rede, tem mostrado ano após ano a insatisfação dos gestores educacionais com a baixa qualidade, o deslocamento do fazer pedagógico concreto nas escolas, quando não ausência de cursos de formação e de capacitação por parte do governo. As funções de gestão, entre elas a de coordenador pedagógico, são extremamente prejudicadas por isso, e pela falta geral de condições de trabalho.

Citando uma frase do texto: “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina a aprender” – o coordenador pedagógico precisa de formação para aprender e ensinar.

Este preâmbulo é importante para o embasamento de uma leitura crítica do texto publicado pela Revista Gestão Escolar, que traz uma abordagem diferente e até polêmica do trabalho do gestor.

 

Veja o texto da revista a seguir:

 

Por que o coordenador pedagógico pode ser o melhor formador de professores

A formação do professor está muito vinculada à ideia de que ele deve ser o especialista de sua disciplina, mas isso precisa mudar

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 Fonte: Gestão Escolar

formação de professores é uma das estratégias mais apontadas quando se fala em qualidade educacional. As possibilidades de viabilizar tal formação são inúmeras, mas aqui vou me ater a uma delas: o papel do coordenador pedagógico na formação continuada de docentes.

Em conversas com colegas percebi que é mais comum que o coordenador pedagógico se enxergue como multiplicador ou articulador dessas formações. Defendo o contrário. Creio que os coordenadores pedagógicos têm muito a contribuir para a formação continuada de docentes. Ninguém melhor que esse profissional conhece o perfil de sua equipe docente, as demandas dos educandos e o contexto da escola.

Na elaboração da proposta de formação de professores, o coordenador pedagógico não pode perder de vista dois aspectos: sua posição como aquele que é detentor do saber e a solidão de seu trabalho docente.

Como detentor do saber, ainda é muito comum que os professores sejam formados pelas faculdades para ser tudo, exceto educadores. O desejo de torná-los altamente capazes de dominar os saberes próprios de sua disciplina, bem como de entupi-los de teorias sem propor sua articulação com a prática faz sair dos cursos de graduação profissionais que não estão preparados para a sala de aula.

Falo por mim. Pouco ou nada sabia da efetiva aprendizagem em sala de aula até pisar em uma como professor. Minha experiência era a de aluno e meu fazer pedagógico inicial se baseou naquilo que vi meus professores fazerem, para o bem e para o mal. Mas como desejamos ir, parafraseando Nietzsche, além do bem e do mal, a prática me mostrou que ou buscava formação mais específica e adequada, ou jamais conseguiria desempenhar meu papel de professor no século XXI.

Não há novidades quanto a isso, há mudança de postura. A minha – e a de muitos outros – veio com Paulo Freire, descoberto por mim décadas depois. Embora seja nosso Patrono da Educação e seja sempre citado aqui e acolá, suas ideias ainda não impactaram a sala de aula satisfatoriamente. Não precisamos dizer muito sobre isso a não ser aquilo que foi exaustivamente dito por ele: “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”.

A formação do nosso professor ainda está muito vinculada à ideia de que ele deve ser o especialista dominador de sua disciplina como alguém encerrado em uma torre de marfim. Nosso professor sente-se muito desconfortável com a incerteza. E com razão: a sociedade – e os educandos – também esperam dele respostas para tudo.

E esse é um ponto no qual o coordenador pedagógico pode atuar para desconstruir. Sem dúvida enfrentará resistência, pois nesse caso trata-se de autodefesa, justa inclusive. No entanto, ninguém melhor que ele pode (de)formar seus colegas professores.

O outro aspecto que pode ser alvo do processo formativo proposto pelo coordenador pedagógico é o fazer docente como ato solitário. Permitam-me o trocadilho, mas precisamos tornar nossos professores solidários.

A prática docente, como bem o dizem Lessard e Tardif, em um belo e minucioso livro chamado O Trabalho Docente, tem sido um ato isolado. O professor entra na sala de aula, fecha a porta e esse espaço passa a ser um microcosmo alheio ao restante da escola, à comunidade e à sociedade em geral.

Iniciativas como a docência compartilhada, a organização curricular em projetos e práticas interdisciplinares mostram-se saídas para esse isolamento, mas é preciso atacar no ponto fulcral desse ostracismo: o discurso da minha aula. Infelizmente, o professor se construiu enquanto profissional como dono da aula que, assim, deixa de ser um tempo e um espaço para a troca e a construção compartilhada de conhecimento, com alunos e outros colegas, e passa a ser um feudo impenetrável. Como seria bom se um grupo de professores pudesse dizer “nossa aula de hoje”, como de fato há experiências relatadas Brasil afora.

Mas como fica o coordenador diante desse feudo? Aqui acredito que seu papel formativo associado à sua função como articulador do projeto da escola é a melhor forma de quebrar esse isolamento – melhor e única, pois as demais formações estão fora da escola e não reúnem aquele grupo de docentes.

Algumas redes têm garantido efetivamente o tempo de coletivo para o professor fora da sala de aula. Ainda há muitas dificuldades pela própria condição dos professores que, em vista de baixos salários, são forçados a acumular aulas em duas ou três escolas, além das obstruções burocráticas colocadas pelos sistemas para negar ao professor o acesso ao tempo de horário coletivo. No entanto, também ouvimos de colegas educadores discursos de pouca valorização desse tempo, como se o horário de formação em serviço fosse um fardo a ser carregado.

Por isso é importante que os coordenadores pedagógicos garantam a efetividade desse horário, e garantir sua efetividade significa:

  • Conscientizar a equipe de que o horário coletivo é o coração do processo para qualificação e articulação da proposta curricular da escola;
  • Cobrar o devido respeito de todos os profissionais aos tempos previstos para essa formação e planejamento da proposta da escola, considerando que assiduidade e pontualidade são fundamentais;
  • Construir uma pauta formativa e de planejamento que seja significativa para todos, em que teoria e prática estejam intimamente relacionadas;
  • Propor uma bibliografia que não subestime os professores em sua dimensão intelectual, afinal o professor também deve ser um pesquisador;
  • Avaliar constantemente o processo de formação, de modo que se possa perceber sua articulação à sala de aula e sua efetividade na transformação da escola.

Não é trabalho que se faça em um mês. Tudo que mexe com a cultura instituída em uma comunidade exige paciência para mudar, mas também coragem para fazê-lo. Afinal, é tão importante compreender como questionar.

 Texto original: Gestão Escolar - gestaoescolar.org.br

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